segunda-feira, 24 de outubro de 2011

SAD DAY

Li um livro, não sei quando exatamente, mas ainda não estava grávida, se chama O Guardião de Memórias e sem entrar em detalhes a parte da história que me toca hoje, que já sou mãe é a que relata o desespero de uma mãe que dá a luz a gêmeos e um deles (para ela) morre ao nascer. Quando li o livro me impressionei com a dimensão que esta morte tomou na vida daquela mulher, foi como uma sombra que a acompanhou até o fim da narrativa. Ela me pareceu, pela angústia e desnorteamento, uma pessoa que viveu na solidão extrema, como se ninguém entendesse o que ela sentia...hoje me senti assim. Acredito que umas pessoas mais, outras menos, sentem a morte de um filho que acabou de nascer ou que viveu por pouco tempo.
Quando se tem gêmeos e um deles morre a presença da outra vida, do outro filho, ganha para as pessoas que nos rodeiam uma feição compensatória e de importância extrema. Como mãe digo que a presença da Helena na minha vida não é compensatória, ela é única e sua individualidade em relação ao Jorge se mantém claramente para mim. As pessoas não podem me ver triste que logo vão dizendo que tenho que agradecer e ser muito feliz por ela e pelo que ela traz a minha vida...e eu sou! A minha tristeza nem de longe se relaciona a ela, ela é fonte de alegria inesgotável...mas hoje a sombra da morte do Jorge me rondou e pousou sobre mim com um peso inimaginável...acho que escrevo aqui para lembrar sempre de como me sinto, de que ele existiu e porque sei que ninguém próximo a mim entenderá o que se passa no meu coração.
Hoje é um dia típico de Ouro Preto, quem conhece a cidade sabe bem como é...neblina baixa, chuvinha constante e frio cortante...acho que o tempo ajudou a nublar os meus sentimentos. Estava arrumando umas caixas e me deparei com uma latinha linda, na hora não percebi o que era e acabei abrindo para conferir (será que não percebi ou bloquear a lembrança foi a minha defesa?), aí me deparei com um embrulhinho de papel toalha amarrado com fita crepe escrito "entregar para os pais do Jorge", na hora senti uma sensação de picadas de abelha nas costas que subiram pelos braços e acabaram no meu queixo...era a pulseirinha da maternidade do Jorge. Nós não abrimos o embrulho! Ele está assim até hoje e assim ainda ficará, olhei, olhei e não tive coragem de abrir.
O Jorge, como disse em uma postagem anterior, foi o primeiro gemelar a ter o sexo identificado e por isso já tinha um enxoval, no mais quando nasceu ganhou duas medalhas de anjos da guarda. Quando ele morreu eu mesma quis arrumá-lo no caixão, não sei porque, acho que pensei que ele merecia que a mãe o colocasse para dormir pelo menos uma vez...e para sempre. Coloquei a roupa que ele sairia da maternidade, o manto e as medalhinhas dos Anjos. O enxoval eu doei logo que a Helena saiu do hospital. Não temos fotos do Jorge, até os dez dias de vida não nos foi permitido tirar fotos e no 11º dia de vida ele entrou em choque e aí nem pensamos mais em fotos...o que guardo são detalhes das minhas observações...mãozinhas, pesinhos, sombrancelha, boquinha, olhinhos...tudo meio separado, em flashes e a pulseirinha  Ninguém da minha família, ou do meu marido viu o Jorge. Eu escolhi não fazer velório e enterrá-lo sem abrir o caixão...não queria que as únicas lembranças dele estivessem ligadas a um corpinho deformado e machucado, afinal ele não estava mais ali...ele teve que ser exumado pois estava na sepultura da família e um tio faleceu pouco depois dele...queria assistir mas minha mãe achou melhor não e fiquei receosa com a minha reação...assim deixei como estava.
A postagem de hoje é como um diário, faz parte de mais um flash do Jorge, na minha memória e no meu coração para sempre.
para você com todo o meu amor querido filho...obrigada por existir em nossas vidas.

Um comentário:

  1. Sandra, conheci seu blog hoje, depois que vc deixou uma mensagem no meu. Só queria te dizer que se tem uma pessoa nesse mundo que entende a sua dor, sou eu. Também tenho essa impressão, que ninguém entende a minha dor de perder um filho que viveu em estado quase vegetativo por 4 anos, como se o melhor para ele mesmo fosse partir. Qual é o certo ? Quem sabe ? Mas essa dor que nunca vai embora vai contra toda e qualquer razão...Obrigada pela sua mensagem, e um beijo no seu coração !
    Valeria (Mão do Felipe: valeriapellon.blogspot.com)

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