quinta-feira, 12 de junho de 2014

CARTAS AO JORGE #1

Meu querido,

esta é a primeira das cartas que espero escrever para você. Escrever é um bálsamo, pelo menos para mim, funciona como um sopro de ar fresco em um dia de sol quente e por isso, para acalmar o que sinto em relação à você, escreverei. Espero, algum dia, em um futuro não tão distante, ler e me sentir menos influenciada pelos sentimentos que me tornam hoje uma pessoa que eu não diria triste, mas um tanto quanto subordinada à sua ausência, um vazio que ocupa lugar considerável no meu coração.

Resolvi escrever porque um dia desses tive uma experiência estranha. Eu acredito em pessoas que sentem a presença de outras que já se foram, não em todas é claro, mas naquelas que se abrem a esta possibilidade sem ter ganhos, sejam eles financeiros ou de atenção e visibilidade. Esta minha posição não tem nada a ver com a minha espiritualidade ou racionalidade, mas com uma crença de que as pessoas estão em um outro lugar e não simplesmente deixam de existir. Pois bem, senti você, na verdade vi você.

Estava encostada na porta da cozinha tomando uma xícara de café preto e de repente você passou por mim, um menininho de cabelos negros como o ébano, de pele alva como a da sua irmã e olhos pequenos e castanhos...foi tão real que quase pude sentir seu cabelo...não fiquei triste e nem preocupada. Posso estar sugestionada, claro! Tenho pensado muito em você e em como estaria nossa família com mais uma criança, talvez a proximidade dos 40 anos tenha me feito pensar na impossibilidade futura de outra gestação e daí comecei a imaginar que esta situação poderia estar resolvida se você estive aqui...mas tenho que confessar que gostei, gostei de te ver aqui, gostei de ver você, gostei de sentir sua presença...

Daí comecei a pensar em buscar você. Como? Seus restos mortais estão enterrados com minha querida avó materna e sempre tive vontade de trazê-los para perto, sempre. Deixando a morbidade da situação de lado gostaria de cremá-los e colocar a urna em um lugar especial em casa, sinto como se pudesse, assim, ter minha família completa e unida. Ainda não falei com seu pai, ele ergueu uma grande muralha ao redor deste assunto e sua remoção não é tarefa das mais fáceis, mas saiba, meu querido menino, que independente da sua presença física você é um dos meus grandes amores (Lelê e papai estão tete a tete) e nunca, mesmo que não consiga trazer suas cinzas para perto de mim, você estará longe do meu coração, sua morada para sempre...

com amor

Mamãe

2 comentários:

  1. lágrimas, claro. mas também um sentimento de admiração muito verdadeiro. Mesmo sem nos conhecer, você sempre me passou uma coisa muito boa "sem ter ganhos, sejam financeiros de atenção ou visibilidade". por fim, obviamente um outro filho não iria nunca substituir o Jorge, mas traria mais alegria. filho sempre traz mais alegria. não sei exatamente qual a sua posição/ situação sobre isso, mas eu dou a maior força.
    beijo grande.

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  2. Ai Sandra, que carta hein?!
    Poxa, querida, eu fiquei aqui imaginando essa dia em que vc viu o Jorge... eu acredito sim. Deve ter sido bom e ter sido triste e ter sido mais um montão de coisas... Sabe, apesar da grande muralha, acredito que com muito amor, conseguimos transpô-las todas, então, se é importante pra vc (e eu acho que seria pra mim tb, sobre a família ficar perto e tal), fale com seu marido, quem sabe...

    E sabe, não sei no que exatamente vc acredita, mas quem sabe numa próxima gestação o Jorge possa voltar...

    Beijo grande querida!

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